Como devemos atuar diante de crises de imagem

Por que esperamos sempre uma crise para reagirmos ao invés de trabalharmos de forma preventiva? Respondemos aos ataques, mas de que forma?

Vídeos sensacionalistas, usando rostos globais e com altíssimo alcance são recorrentes. O exemplo que vimos essa semana mexeu com o setor, que se irritou, gerando uma avalanche de respostas com diferentes abordagens. A questão principal é: Por que esperamos sempre uma crise para reagirmos ao invés de trabalharmos de forma preventiva? A segunda: Respondemos sim, mas de que forma?

Para responder essas questões convidamos especialistas em comunicação e que ou produzem leite ou estão muito próximos do setor. Inauguramos aqui uma coluna dedicada a tratar do tema “comunicação com o consumidor” e pedimos que você produtor ou profissional ligado a indústria se atentem a esse tema mais do que nunca.

Atores e influencers creem no que pregam?

Fernanda Bacelar, produtora e publicitária, nos responde trazendo a palavra coerência. No caso Marcio Garcia, ele mesmo fez campanhas há pouco tempo de produtos que levavam leite ou comendo cereais com leite e que, portanto, não há coerência entre ação e discurso. Há no meio publicitário um dito “skin in the game” que nada mais é do que ter a pele em jogo, o que não é a maioria dos casos com certeza. Não é à toa que no ranking de confiança os publicitários são os lanterninhas, dividindo espaço com políticos e banqueiros . Bacelar traz uma pesquisa, mostrando que o comportamento do consumidor nesse sentido está mudando, pois 86% das pessoas responderam que atualmente preferem clientes reais nas comunicações a influencers tradicionais que recomendam produtos (pesquisa Entribe USA). O que nos abre uma grande oportunidade, já que não existe algo mais real do que produtores rurais com suas vacas mostrando como as coisas são feitas no dia a dia.

Fernanda provoca dizendo que apostaria que ninguém ou quase ninguém na cidade faz ideia de que uma vaca passa 12 horas descansando, comendo uma dieta muito mais rica e balanceada que a nossa. Ou ainda, que suas camas são arrumadas e que tomam banho várias vezes ao dia. É sobre isso que deveríamos falar, ressalta Fernanda.

A grande maioria dos influencers vive de publicidade e quando se engajam em causas diversas conseguem impulsionar muito mais seu público a admirá-lo não apenas pelo trabalho em si, mas por outras narrativas. Michael Jackson, princesa Diana, Beyonce entre tantas outras celebridades seguiram esse caminho, que se é genuíno ou não nos cabe julgar, mas com certeza traz uma obviedade: é no mínimo tentador. “Skin in the game”.

Devemos reagir as crises ou preveni-las?

O setor leiteiro faz movimentos para se unir, se articular melhor, mas quando se trata de uma força maior para trabalhar estruturalmente o marketing e criar uma imagem dos lácteos como algo positivo, quase nada existe. Diana Jank, diretora de marketing na Letti e defensora da imagem positiva do leite diz que “Se eu pudesse definir este momento, definiria como um grande barulho desorganizado e desorientado, porém extremamente forte e potente. Acho essencial ressaltarmos o alcance do setor unido. Se move montanhas dessa forma, imagine com algo bem estruturado.”

De fato, a resposta foi forte e causou a retirada do vídeo do perfil do ator além de um pedido de desculpas, porém, após o estrago. Segundo Diana ainda “A problemática é mais profunda do que simplesmente responder com um vídeo ou uma nota de repúdio. Eu acredito no conteúdo frequente, embasado, transparente e falando a mesma língua do consumidor urbano… vamos nos posicionar, vamos lotar o vídeo de comentários, vamos tomar as medidas legais e vamos fazer barulho, mas saibamos sempre quão importante é termos uma cadeia munida de argumentos comprovados, verdades embasadas e bom storytelling. Sem isso, a gente não alcança e nem se conecta com o consumidor.”

O agro muitas vezes vive fechado em si mesmo, seja em grupos de produtores no WhatsApp ou redes sociais como Facebook e Instagram. Assim, mostra grandes dificuldades de dialogar com pessoas que nunca viram uma vaca na vida e que, portanto, são vulneráveis a todo tipo de absurdo que um vídeo sensacionalista traz. A grande massa talvez não esteja engajada em causas como veganismo, mas acaba modelando seu consumo apenas por ter uma impressão ruim de determinados alimentos. A esta população nos cabe trazer constantes imagens positivas e reais de forma que haja algo bom ligado a ideia de consumir leite, sem peso na consciência. Diana completa dizendo que o reforço positivo deveria fazer parte do dia a dia de todos da cadeia, mas que os pontos de ataque levantados sejam sempre desconstruídos de forma a não deixar arestas e terem chance de serem tomados como verdade.

Crises ocorrerão, mas como passar por elas da melhor forma possível?

Inês Rimondi, é consultora na área de comunicação na Argentina, especializada na área de produção leiteira e tem uma larga experiência na contingência de crises como esta. Ela defende que enquanto não tivermos uma agenda própria com embaixadores fortes para combater a desinformação, não teremos grandes resultados. Inês recomenda que o setor se baseie em alguns pontos cruciais

  • Identificar mensagens chave
  • Treinar embaixadores idôneos
  • Assumir e sustentar uma agenda de comunicação própria do setor que vá construir narrativas com legitimidade social.

Isto é, elencar exatamente o que e como falar e ter pessoas com credibilidade real para fazê-lo de forma que o grande público entenda. Rimondi nos lembra que a ideia de Fake News, informações enviesadas e todo tipo de sensacionalismo são moedas de troca há anos e que num momento de crise como este é normal reagirmos com agressividade ou mesmo ficarmos divididos entre atacar de volta ou apanhar calados. Porém, ver constantes ataques de formas muito parecidas apenas denunciam que não temos narrativas próprias para usar nessas horas.

Sobre as respostas, Diana Jank lamenta dizendo que é necessário manter o foco, pois ao se responder a um ataque sobre bem-estar animal com acusações sobre posicionamento político, intolerância e outros pontos, só irá desvirtuar a discussão além de ser algo completamente negativo para a imagem do setor.

É necessário que a agressividade seja canalizada para uma conversa racional e que o discurso seja focado em tantos pontos positivos que o setor tem como os investimentos crescentes em bem-estar animal, no cuidado que produtores e técnicos têm com cada vaca e, ainda, que ninguém sente prazer em ver um animal doente. Fernanda reforça que esse deveria ser o foco nesses momentos: responder o que foi dito, com base em realidade, com consistência.

Em conclusão, é necessário pensar em duas frentes: uma de estruturação do setor para evitar estragos que vídeos e conteúdos assim possam causar e outra de aprendermos a lidar com crises como essa. Ambas envolvem a necessidade de parar, respirar e pensarmos a médio prazo. Não é possível melhorar a imagem de um produto sob ataque simplesmente reagindo com fúria nas redes sociais. O caminho é a educação do setor como um todo. Por aqui vamos falar cada vez mais desse assunto trazendo reflexões, ideias, participações nos nossos eventos e tudo que estiver ao nosso alcance, porém nada disso é valido se ao passar essa onda cairmos na rotina esperando que a próxima venha.

Texto publicado em www.milkpoint.com.br

Autores: Hayla da Silva Fernandes / Ines Rimondi / Diana Jank / Fernanda Bacelar